Alécio,
Você vai fazer uma falta danada. Daqui de longe, das Alagoas, sinto saudades de nossos papos, nossas leituras, nossos abraços, naquela redação da Padre Rolim, lá em Belo Horizonte dos anos 1990. Você fechando, com todo esmero possível, as páginas maravilhosas do caderno de Cultura. Suas matérias eram supimpas, eu devorava suas páginas domingueiras, tomando um chope, fumando um charuto na cafeteria da Afonso pena. Lembro também de nossos cafés na livraria vizinha (a sucursal da redação), ou nas noitadas no bar do Toninho.
De nossos aniversários, geminianos que somos, 7 de junho você e eu 9, comemoramos tanto junto com amigos, com nossa turma da redação nossa de cada dia. Ô tempo bão demais. Sua morte nesse último sábado de novembro, em pleno verão dos trópicos, deixou um vácuo insuperável. Não será fácil esquecer.
Você sempre será um jornalista exemplar, e agora você já deve estar fechando o Diário Celeste, em letras azuis garrafais, com Deus lá no alto, e protegendo todos nós aqui embaixo com suas asas de anjo eterno. Para sempre Alécio serás, para sempre viverás em nossos corações.
um beijo fraterno,
Mário Lima
PS: Quando for a BH vou ver Marcinha, e seu herdeiro, para matar as saudades
Para meus queridos seguidores vai abaixo poesias de Alécio de seu primeiro livro Lírica Caduca
Água Forte
palavras são riscos
grafite pintada em tons tristes
então olhas o outro
revolução dos pinceis
as cores mudam
desnudam o sentido
exato dos astros
tua boca sorri
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Elegia
os cílios do poeta trazem
da sombra cinzas trêmulas
colisão
olhos em devaneio
e dádiva
quem crê nestas fagulhas tristes
ardendo sob quieta lágrima
nulo destino em declive
discreta descida aos infernos
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Lendo Drummond
exigir da pedra
nenhuma explicação
pelos caminhos
2009/11/30
2009/11/07
As nuvens do sábado
Caros Amigos,
Que madrugada gostosa essa minha, no meu quarto-gabinete, com Simone sonolenta na cama, e eu ouvindo instrumentais brasileiros, com Egberto Gismonti, Eumir Deodato, César Camargo e Vitor Assis Brasil. Mas hoje é sábado, como disse em versos o poetinha Vinícius de Moraes.
Para mim é o dia mais gostoso, paira no ar uma sensação de leveza, de relaxamento, de sair por aí, de óculos escuro, mãos dadas com o amor, ver o sol passando inclinado sobre as nuvens, e nossas sombras dançando pelas ruas, atrás dos sabores da vida. Olhar em volta, as pessoas passando, namorando, conversando sem parar.
Sábado é uma dia de alegrias. É impossível ficar triste, tamanho os horizontes a serem singrados, pelas calçadas, pelas areias da praia, pelas folhas caídas da praça, pelo sorriso das crianças em alvoroço, pelo chope gelado nos botequins, pelos jornais reluzentes nas bancas de revistas, pelas horas de não estar nem aí.
Poder acordar tarde, espriguiçar, esparramar na cama, fechar novamente os olhos e sonhar. Sonhar com os infinitos verdes dos mares, voar sobre as ondas, ou tomar o céu e romper o algodão das nuvens. Acordar nos braços da amada verdadeira, talvez quem sabe com um café fumegante na cama, com torradas quentinhas e geléia de morango à vontade.
Uma ducha friinha para amanhecer de vez, e preparar o espírito de andarilho e ganhar o dia, e não precisa ser em Londres ou Nova Deli, ou nos caminhos on the road de Kerouak pela Califórnia dos anjos alucinados. É só estar bem vivo. Mas já está um pouco tarde, fecho minha mensagem com uma poesia revigorante para meus seguidores irmãos e irmãs. Um ótimo sábado para vocês, que os anjos te iluminem nesse sábado e em todos os sábados de suas vidas.
beijos de sábado de verão
O dia da criação
Vinícius de Moraes
Macho e fêmea os criou.
Gênese, 1, 27
Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.
Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.
Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Hoje há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito-de-porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criançinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado
III
Por todas essas razões deverias ter sido riscado do Livro das Origens,
ó Sexto Dia da Criação.
De fato, depois da Ouverture do Fiat e da divisão de luzes e trevas
E depois, da separação das águas, e depois, da fecundação da terra
E depois, da gênese dos peixes e das aves e dos animais da terra
Melhor fora que o Senhor das Esferas tivesse descansado.
Na verdade, o homem não era necessário
Nem tu, mulher, ser vegetal, dona do abismo, que queres como
as plantas, imovelmente e nunca saciada
Tu que carregas no meio de ti o vórtice supremo da paixão.
Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas
em queda invisível na
terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre a renda
e missa de
sétimo dia.
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das
águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em [cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e [sim no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.
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